A indústria amazonense adota cautela e prudência após o anúncio da taxação de 50% do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump. O superintendente da Zona Franca de Manaus (Suframa), Bosco Saraiva, afirmou que o posicionamento do Amazonas é o mesmo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que já em nota deixou muito clara a posição do governo brasileiro em relação a essa medida.
“Do ponto de vista das exportações do Polo Industrial de Manaus, é, esse volume é quase que insignificante para o seu faturamento, o faturamento que temos divulgado regularmente nos últimos tempos. Evidentemente que a cautela e a prudência nesse momento devem ser o norte do nosso comportamento. Assim será aqui na Suframa, porque nós acreditamos fortemente na capacidade de negociação do nosso governo e do nosso ministro”, disse Bosco.
De acordo com o presidente do Conselho Superior do Centro da Indústria do Estado do Amazonas (Cieam), Luiz Augusto Barreto Rocha, enquanto o debate sobre o futuro da Amazônia tende a oscilar entre extremos — a paralisia contemplativa e a exploração predatória —, o Polo Industrial de Manaus (PIM) oferece, há mais de cinco décadas, uma solução concreta, equilibrada e com resultados comprovados. Trata-se de uma experiência singular de desenvolvimento nacional que conjuga produção industrial, inclusão social e proteção ambiental.
“Hoje, com a participação estruturada na Pesquisa Firmeza do Banco Central do Brasil, o PIM dá um passo a mais: presta contas diretamente à sociedade brasileira, mostrando com dados e fatos que, no coração da floresta, pulsa uma indústria moderna, resiliente e capaz de formar gente”, disse o presidente do conselho.
Luiz Augusto Rocha explicou que em maio de 2025, o Polo Industrial de Manaus registrou 132.886 empregos formais diretos, com saldo positivo de 607 novas vagas no mês, mesmo diante de retrações conjunturais em faturamento e importações. “Mas o dado bruto não revela toda a riqueza do processo. O que merece destaque é a qualidade das oportunidades geradas”, ressaltou.
O presidente do conselho superior Cieam explicou que a indústria instalada no PIM não se limita a empregar. Ela forma, capacita e integra. Em linhas de produção, laboratórios, centros de pesquisa e núcleos de engenharia, jovens de origem humilde têm acesso à qualificação técnica de ponta. Segundo ele, são programas internos de formação continuada, parcerias com institutos de ensino e mecanismos de ascensão funcional que transformam o chão de fábrica em ambiente de aprendizagem profissional.
“Para além da formação técnica, a convivência em ambientes produtivos organizados, com respeito à diversidade, segurança e bem-estar, cria um ecossistema de trabalho que favorece o amadurecimento humano e a inserção social plena”, explicou Luiz Augusto Rocha.
Conforme o presidente do conselho do Cieam, em um cenário nacional marcado por disparidades salariais e desvalorização do trabalho, o Polo Industrial de Manaus apresenta um desempenho surpreendente — e frequentemente ignorado. “De acordo com os dados mais recentes do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), Manaus figura entre as capitais com os maiores salários médios do Brasil, ocupando o 4º lugar no ranking nacional. Esse dado, por si só, já contraria o senso comum que reduz a Zona Franca a uma política assistencialista. Aqui, paga-se bem porque se exige muito e se investe melhor ainda”, explicou.
Luiz Augusto Rocha disse que as fábricas do PIM desenvolveram, ao longo das décadas, um robusto ecossistema de gestão de pessoas, que vai muito além do mero treinamento operacional. “São cursos técnicos, ciclos de palestras, programas de formação continuada, incentivos educacionais, parcerias com instituições de ensino e programas internos de liderança que revelam talentos da base ao topo. Ele explicou que muitas indústrias mantêm convênios com o Senai (Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial), o Ifam (Instituto Federal do Amazonas), a UEA (Universidade do Estado do Amazonas), a Ufam (Universidade Federal do Amazonas) e com universidades privadas, garantindo trilhas de crescimento e especialização”, disse.
O presidente do conselho do Cieam disse que o Norte do Brasil, com sua matriz industrial peculiar, passa a ter voz — e conteúdo — na construção das análises macroeconômicas nacionais. “Nesse novo ambiente de escuta qualificada, as boas expectativas e os desempenhos positivos do Polo Industrial de Manaus emergem com nitidez. Empresas antes invisíveis aos modelos tradicionais de análise agora são reconhecidas como parte relevante da engrenagem econômica nacional”, ressaltou.
De acordo com o presidente do conselho do Cieam, o primeiro destaque dessa nova fase é que o Banco Central do Brasil, por meio do Relatório Firmeza, resolveu ouvir diretamente quem produz, deixando de se orientar exclusivamente pelas percepções do mercado financeiro reunidas no Relatório Focus. Esse gesto tem peso simbólico e prático. Luiz Augusto Rocha informou que se abre, enfim, uma escuta institucional a realidades produtivas antes invisíveis à macroeconomia oficial.
“É nesse novo cenário que o Polo Industrial de Manaus ganha visibilidade. As boas expectativas e desempenhos das nossas indústrias — historicamente ignorados nas análises centrais — emergem com nitidez e solidez. Produzimos, geramos empregos, formamos técnicos, movimentamos a economia e preservamos a floresta. Agora, isso é quantificado, registrado e, sobretudo, respeitado”, explicou.
O presidente do conselho do Cieam explicou que a Zona Franca de Manaus não é um favor fiscal nem um enclave improdutivo. Segundo ele, é um projeto de país, desenhado para proteger a Amazônia pelo trabalho formal, pela industrialização racional e pela formação de gerações inteiras de profissionais — que aprendem a produzir sem destruir.
“Diferentemente do que se costuma sugerir nos centros financeiros do país, a indústria da Amazônia contribui de forma desproporcionalmente alta com a arrecadação nacional. Segundo estudo de Costa, Rocha e Machado (2024), o Amazonas é o estado brasileiro com maior participação de impostos sobre a produção em relação ao próprio PIB, superando a média nacional e a média da Região Norte”, disse.
O vice-presidente da Federação das Indústrias do Estado do Amazonas (Fieam), Nelson Azevedo, disse que a decisão dos Estados Unidos de aplicar uma tarifa de 50% sobre produtos importados do Brasil, especialmente itens de aço e alumínio, impõe mais um desafio ao ambiente de negócios da Zona Franca de Manaus.
“Trata-se de uma medida que distorce o comércio internacional, prejudica cadeias produtivas sustentáveis e compromete o esforço de internacionalização das nossas indústrias. Embora os EUA não sejam o principal destino das exportações da ZFM, eles representam o segundo maior parceiro comercial do Amazonas, o que torna essa decisão extremamente preocupante”, disse o economista.
Nelson Azevedo explicou que a ZFM, ao longo dos anos, vem buscando aumentar seu grau de inserção nas cadeias globais de valor. Segundo ele, uma medida protecionista como essa vai na contramão do que se espera de parceiros comprometidos com o desenvolvimento sustentável, a segurança energética e a transição verde. “Sabemos, a propósito, que essa agenda já foi publicamente abandonada pelo governo Trump”, disse.
Nelson ressaltou que a medida impacta diretamente produtos de aço e alumínio com algum grau de industrialização – principalmente bens intermediários utilizados nas linhas eletroeletrônicas e de duas rodas. Ele disse que isso inclui, por exemplo, estruturas metálicas, componentes de bicicletas, peças de refrigeração, linhas de energia solar, além de produtos que usam aço como insumo em bens duráveis.
“Ainda que parte significativa da produção da ZFM seja voltada ao mercado interno, diversas empresas têm buscado ampliar exportações, e essa sobretaxa limita o potencial competitivo justamente nos setores que mais investem em inovação e sustentabilidade. Segundo dados da própria Suframa e do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC), os EUA foram responsáveis por cerca de 13,5% do total exportado pelo Amazonas em 2024. De janeiro a junho deste ano, o volume de exportações para o mercado americano ultrapassou US$ 270 milhões, com destaque para produtos do setor eletroeletrônico, duas rodas, concentrados para refrigerantes e componentes industriais. Esse desempenho positivo pode ser comprometido caso a medida tarifária seja mantida”, destacou.
Nelson disse que a Federação das Indústrias do Estado do Amazonas repudia medidas unilaterais que restringem o comércio justo e afetam a produtividade e a sustentabilidade de regiões periféricas como a Amazônia. O economista explicou que a Zona Franca de Manaus é um modelo de desenvolvimento regional baseado em incentivos legais e sustentáveis, com forte contribuição para a preservação ambiental e geração de empregos.
“Não é razoável que produtos industriais que respeitam normas ambientais e empregam milhares de trabalhadores sejam penalizados por decisões de cunho meramente político. A Fieam defende que o governo brasileiro adote ações diplomáticas firmes, inclusive no âmbito da Organização Mundial do Comércio (OMC), e que amplie apoios à indústria nacional, com mecanismos de compensação e incentivo às exportações de base sustentável”, finalizou.
Efeitos
De acordo com a Secretaria de Desenvolvimento, Ciência, Tecnologia e Inovação (Sedecti), o aumento de tarifas não deve causar efeitos significativos sobre a Zona Franca de Manaus (ZFM). O secretário de Estado de Desenvolvimento Econômico, Ciência, Tecnologia e Inovação, Serafim Corrêa, afirmou que os efeitos da taxação anunciada pelo presidente dos EUA, Donald Trump, são mínimos ao PIM.
“Claro que o aumento de tarifas nas exportações brasileiras para os Estados Unidos tem consequências para o país como um todo. Essa é uma questão que vem sendo tratada com a devida cautela pelo Governo Federal, com posturas firmes de uma nação independente e soberana. No entanto, quando falamos da Zona Franca de Manaus, o impacto é praticamente nulo. Neste momento, seguimos acompanhando os desdobramentos, mas reafirmo que, para a Zona Franca, o efeito é nulo”, destacou.
Atualmente, a ZFM exporta somente 1,5% de seu faturamento, sendo que deste percentual, menos de 10% têm como destino os Estados Unidos. Nesse sentido, apenas 0,15% do faturamento da Zona Franca de Manaus estaria sujeito às novas tarifas.
Em 2025, as exportações para o país são ainda menos expressivas. Com participação de 8,74% na compra de produtos produzidos na ZFM, os EUA ficam atrás de Alemanha, China, Argentina e Colômbia que lideram a lista de principais exportadores do Amazonas.
Ainda segundo a Sedecti, a maior parte da produção do PIM destina-se ao mercado interno brasileiro. Além disso, a balança comercial entre a ZFM e os EUA é amplamente favorável aos americanos, tendo em vista que o Amazonas importa do país quase 20 vezes mais do que exporta. Ou seja, uma possível disputa comercial tende a ser mais desfavorável ao país norte-americano.
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