O Amazonas enfrenta um dos mais longos períodos de ausência feminina na representação federal. Desde as eleições de 2018, nenhuma mulher amazonense conseguiu conquistar uma das oito cadeiras destinadas ao estado na Câmara dos Deputados, acumulando 7 anos sem presença feminina no Congresso.
O cenário contrasta com momentos relevantes da história política do Amazonas, quando nomes de destaque nacional ocuparam mandatos tanto na Câmara quanto no Senado. Ainda assim, especialistas afirmam que a sub-representação feminina permanece como uma marca estrutural do sistema político brasileiro.
Desde a redemocratização, apenas seis mulheres alcançaram o cargo de deputada federal pelo Amazonas. A primeira delas foi Eunice Michiles, eleita em 1986, que participou da Assembleia Constituinte e marcou a história como a primeira mulher a ocupar uma cadeira no Senado, após assumir como suplente do senador João Bosco, já falecido. No mesmo período, Beth Azize também chegou ao Congresso; eleita em 1986 e reeleita em 1990, destacou-se na Constituinte e em debates relevantes da transição democrática.
Na sequência, Alzira Ewerton foi eleita em 1994 para a 50ª Legislatura, exercendo mandato entre 1995 e 1999. Já Vanessa Grazziotin teve três mandatos consecutivos na Câmara, de 1999 a 2011, até conquistar uma vaga no Senado. Em 2022, tentou retornar à Câmara, mas não obteve êxito. Rebeca Garcia também figurou entre as representantes femininas do estado, tendo sido eleita em 2006 e reeleita em 2010; seu último mandato se encerrou em 2015, após disputar a Vice-Governadoria em 2014, sem sucesso.
A última mulher amazonense a ocupar uma cadeira na Câmara dos Deputados foi Conceição Sampaio, eleita em 2014 e em exercício entre 2015 e 2019. Desde então, o Amazonas não voltou a eleger uma deputada federal.
Nas eleições de 2022, nomes como o da delegada Débora Mafra tentaram romper o ciclo, mas novamente o estado não elegeu nenhuma mulher.
Avaliação do cenário
O cientista político Helso Ribeiro contextualizou o histórico de baixa representatividade feminina no Amazonas e afirma que, embora o estado já tenha contado com figuras de grande relevância, o quadro atual é de retrocesso.
“O Amazonas sempre teve maior presença masculina, tanto no Congresso Nacional quanto na Câmara Municipal e na Assembleia Legislativa. Porém, é importante lembrar que já tivemos nomes de peso em Brasília. A primeira senadora do Brasil foi a Eunice Michiles, que assumiu após a morte do titular. Tivemos também Beth Azize, de grande atuação na Constituinte, e Vanessa Grazziotin, com trajetória sólida tanto na Câmara quanto no Senado.”
O especialista destaca que, apesar de o número de mulheres ter sido sempre pequeno, a qualidade de sua atuação foi significativa. “Eu não falo nem em quantidade, mas em qualidade. Essas mulheres tiveram posições marcantes, enfrentaram a ditadura, contribuíram para a Constituição de 1988 e representaram o Amazonas com preparo técnico e político”, frisa.
Helso Ribeiro afirma que a baixa representação feminina no Amazonas reflete uma lógica nacional, em que o Brasil ocupa um dos piores índices de presença feminina nos parlamentos das Américas.
“Se analisarmos todos os países do continente — do Canadá ao Chile, incluindo o Caribe —, o Brasil tem o menor percentual de mulheres nos parlamentos. Isso é muito grave.”
Segundo o especialista, a realidade no Amazonas confirma o problema: atualmente, há apenas três mulheres entre os 41 vereadores de Manaus e quatro na Assembleia Legislativa, nenhuma delas com cadeira na Câmara Federal ou no Senado.
O cientista político aponta três fatores principais para a exclusão feminina: “Há um machismo estrutural que faz com que líderes partidários se tornem donos dos partidos e escolham quem desejam eleger. Não existe nenhuma mulher na presidência das principais siglas no estado. Além disso, as campanhas estão cada vez mais caras, e as mulheres não recebem o mesmo patrocínio — seja de financiamento oficial ou de caixa dois”.
Ele lembra que, nas eleições anteriores, algumas candidatas obtiveram votações expressivas, mas não o suficiente para garantir cadeiras. “Joana D’Arc e Alessandra Campelo tiveram votações importantes, mas, sem apoio partidário forte e investimento, é muito difícil competir.”
Para ele, o avanço depende de dois movimentos paralelos: maior incentivo dos partidos para lançar e financiar candidaturas femininas e flexibilização de estruturas que impedem o crescimento dessas lideranças. “Se os partidos não se comprometerem de fato em incentivar, financiar e apoiar candidaturas femininas, continuaremos sem representação em Brasília”, afirma.
Com as eleições de 2026 se aproximando, surgem nomes que podem tentar reverter o cenário. Entre eles está a vereadora Thaysa Lippy (PRD), já apontada como pré-candidata à Câmara dos Deputados. A informação foi confirmada por seu pai, o deputado estadual Felipe Souza (PRD). Caso se consolide e tenha apoio partidário, a candidatura representa uma das possibilidades de pôr fim ao jejum de mais de uma década sem mulheres amazonenses no Congresso Nacional.
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